A Allianz divulga a 15ª edição do seu “Relatório de Riqueza Global”, que analisa minunciosamente a situação de ativos e de dívidas das famílias em quase 60 países.
Um surpreendente alívio: os ativos financeiros globais das famílias aumentaram 7,6% em 2023, compensando as perdas do ano anterior.
Não há lugar para depósitos bancários: novos investimentos normalizaram após os anos de boom relacionados à pandemia, à medida que investidores ignoraram os bancos.
Restrição esperada: com o aumento das taxas de juros, o crescimento da dívida das famílias diminuiu ainda mais, para 4,1%, em todo o mundo, o menor aumento registrado nos últimos nove anos.
Recuo: taxas mais altas também pesaram sobre os ativos imobiliários, que registraram o menor crescimento em 10 anos, de 1,8%.
Brasil: crescimento robusto de 7,8%, impulsionado por seguros/previdência.
Alívio surpreendente
O ano de 2023 foi marcado por um forte aperto monetário. No entanto, as economias demonstraram resiliência e os mercados, inclusive, apresentaram desenvolvimento. Neste contexto, os ativos financeiros das famílias globalmente1 cresceram significativamente, com um aumento de 7,6%, que não apenas compensou, mas superou as perdas do ano anterior (-3,5%), totalizando 239 trilhões de euros ao final do ano.
O aumento nas três principais classes de ativos foi bastante desigual. Os títulos (11%) e os seguros/previdências (6,2%) se beneficiaram do boom do mercado financeiro e das taxas mais elevadas, além de crescerem de forma significativamente mais rápida do que a média dos ativos nos últimos dez anos. Por outro lado, o aumento dos depósitos bancários caiu 4,6%, após os anos de boom relacionados à pandemia, registrando um dos menores aumentos dos últimos 20 anos.
A recuperação em 2023 foi ampla. Na verdade, apenas dois países – Nova Zelândia e Tailândia – registraram taxas negativas. Além disso, o crescimento foi relativamente uniforme em todas as regiões, principalmente na Ásia e na América do Norte, que avançaram mais de 8% – com os EUA (8,6%) superando a China (8,2%).
Como resultado, a vantagem de aumento das economias emergentes sobre as economias avançadas encolheu significativamente mais uma vez, chegando a apenas 2 p.p. no ano passado. Em seis dos últimos sete anos, as economias emergentes perderam em grande parte sua liderança de expansão.
Não há lugar para depósitos bancários
Em 2023, a normalização de novos investimentos continuou, após os anos de boom de poupança forçada relacionada à pandemia, que caiu 19,3%, para 3 trilhões de euros. Este declínio é atribuído quase exclusivamente aos depósitos bancários. No geral, os bancos em todo o mundo receberam apenas 19 bilhões de euros, uma queda de 97,7%.
As principais culpadas: as famílias americanas, que liquidaram seus depósitos no valor de 650 bilhões de euros. Por outro lado, as outras duas classes de ativos permaneceram populares entre os poupadores. As entradas em títulos até aumentaram mais uma vez, em 10%.
No entanto, houve uma notável mudança de favoritos dentro desta classe de ativos: enquanto as ações foram vendidas no geral em muitos mercados, os poupadores obtiveram fortes ganhos em títulos, graças à reviravolta nas taxas de juros.
E seguros/pensões provaram ser relativamente robustos, com o declínio em novas economias em todo o mundo chegando a apenas 4,9%.
Restrição esperada
Embora os ativos financeiros tenham se esquivado da reviravolta na taxa de juros, isto teve um impacto claro no passivo dos balanços patrimoniais das famílias em 2023: o crescimento da dívida privada enfraqueceu ainda mais, chegando a 4,1% em todo o mundo, o menor incremento em nove anos. No geral, os passivos globais das famílias totalizaram 57 trilhões de euros no final do ano.
O declínio na evolução da dívida foi observado em quase todas as regiões, sendo particularmente acentuado na Europa Ocidental e na América do Norte, onde o aumento caiu mais da metade, para 1,1% e 2,9%, respectivamente. Como o crescimento nominal da atividade econômica global permaneceu elevado pela inflação, o rácio da dívida mundial (passivo como porcentagem do PIB) decresceu pelo terceiro ano consecutivo, diminuindo 1,5 p.p. para 65,4%. Este índice também foi mais de 3 pontos percentuais menor do que há 20 anos.
O crescimento relativamente forte dos ativos e o aumento relativamente fraco dos passivos levaram a um incremento significativo de 8,8% nos ativos financeiros líquidos globais (ativos financeiros menos passivos), que totalizaram 182 trilhões de euros no final de 2023. Isto representa um aumento de quase 15 trilhões de euros em comparação com o ano anterior e está 4 trilhões de euros acima do valor recorde anterior de 2021.
Revés
A outra classe de ativos que sofreu com o aumento das taxas de juros foi a imobiliária, que registrou o menor crescimento em 10 anos, avançando apenas 1,8%. Na Europa Ocidental, caiu 2,2. Os números seguem tendências passadas, em que as taxas de ampliação do mercado imobiliário ficaram atrás das de ativos financeiros na maioria dos mercados.
Na América do Norte, por exemplo, a diferença anual foi de quase 1 p.p. nas últimas duas décadas, refletindo que ganhos de capital de longo prazo para o mercado imobiliário são menores do que para ações. E o futuro provavelmente será ainda mais desafiador, dado o crescente impacto das mudanças climáticas nos ativos imobiliários.
Embora as catástrofes naturais dominem as manchetes, os custos da transição para edifícios ecologicamente corretos (os chamados riscos de transição) terão o maior impacto em longo prazo. As projeções do House Price Index – HPI (Índice de Preços de Habitação, em tradução livre), em diferentes cenários climáticos até 2050, mostram quedas de 20% ou mais para muitos mercados.
Para todas as economias em consideração, o valor dos imóveis pode ser 30 trilhões de euros menor.
Brasil: crescimento robusto
Os ativos financeiros das famílias brasileiras aumentaram 7,8% em 2023, após 7% no ano anterior. O principal impulsionador foi a classe de ativos seguros/previdência (10,2%), que tem uma participação de 20% na carteira da população do país, ainda que esteja abaixo dos 28% de 2008. As outras duas classes de ativos apresentaram crescimento mais modestos: os depósitos bancários aumentaram 4,6% e os títulos 8,1%, a alta mais fraca em cinco anos.
O quadro é menos otimista em termos reais: ajustados pela inflação, os ativos financeiros aumentaram apenas 3,1% em 2023. Em comparação com o nível pré-pandemia de 2019, no entanto, o poder de compra dos ativos financeiros foi 18,4% maior no final do ano. Isto contrasta fortemente com muitas economias europeias, nas quais os investidores sofreram quatro anos perdidos em termos reais.
Embora o crescimento dos ativos seja sólido, a distribuição continua sendo o calcanhar de Aquiles do Brasil, um dos países com maior desigualdade na distribuição de renda, onde os 10% mais ricos da população possuem 80% do total de ativos financeiros líquidos. Nas últimas duas décadas, a situação não melhorou, muito pelo contrário.
Em linha com a tendência global, o crescimento dos passivos desacelerou, mas permaneceu elevado em 10,6%. Consequentemente, o rácio da dívida subiu ainda mais, para 37%, 2 p.p., abaixo do seu pico em 2015. Os ativos financeiros líquidos, por fim, avançaram 6,8%, ficando em 8.740 euros per capita.
Desta forma, o Brasil permanece em 42º lugar no ranking dos 20 países mais ricos (ver o quadro).
Você também pode encontrar o estudo em nossa página:
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